A Cannabis sativa, mais conhecida como maconha, está na lista negra de boa parte das pessoas do Brasil e EUA. Isso é bem óbvio, mas me surpreendi em descobrir que ela tem toda uma história que a faz ser odiada em todo o mundo e em épocas bem diferentes! Frente à eterna polêmica do “legaliza ou não”, revigorada há pouco tempo pela posição de vários importantes cientistas a favor da legalização, venho aqui mostrar um pouco da conturbada (e manipulada) história da erva. Será que é realmente verdade que ela é tão perniciosa pra nossa saúde? Ela mata neurônios? Causa depressão? Câncer?
A história da maconha é mais antiga do que pensamos. O primeiro contato com o homem data de 6000 anos atrás, na China. Prova disso é a marca de uma corda de cânhamo encontrada numa peça de barro. A fibra da cannabis era usada para confeccionar papel (seu uso como papel foi o que garantiu sua expansão para além do Afeganistão, indo parar na China, Índia e Mesopotâmia), cordas e tecidos. Sua trajetória como substância psicoativa também é antiga. Os chineses conhecem os efeitos da erva há no mínimo 2000 anos. Referências são encontradas na primeira farmacopéia (livro que reúne fórmulas de remédios e receitas de medicamentos) da história: Pen-Ts’ao Ching. No livro constam recomendações de seu uso para aliviar sintomas de diarréia, prisão-de-ventre, malária, reumatismo e dores menstruais. Na medicina ayurvédica, na Índia, ela também tem seu lugar garantido. Seu uso era tão difundido e suas propriedades tão eficazes que ela tinha lugar até na religião. A planta é considerada a comida preferida do deus Shiva, que por isso estaria sempre meio “chapado”, dançando e preservando o equilíbrio entre destruição e reconstrução do mundo. Para os budistas da tradição Mahayana, Buda passou seis anos se alimentando somente de sementes da cannabis, dando forças para que ele completasse seu semi-jejum. Da Índia, foi levada para a Mesopotâmia, ainda em tempos pré-cristãos; o que explica sua presença no local na época da expansão árabe.
Shiva e outros deuses preparando um bhang: um tipo de caldo extraído de folhas amassadas da cannabis |
Quando Maomé surgiu com sua pregação islâmica na região, o álcool foi banido, o que levantou a questão de se a maconha também deveria ser banida. Sua exclusão não se deu por todo o Oriente Médio. Uma seita mística do islamismo, os sufi, continuou usando-a. Até mesmo a Grécia e Roma utilizavam o cânhamo para fazer as velas de seus barcos.
Do Oriente Médio, a planta acabou sendo levada para a África, onde encontrou o solo compatível com suas necessidades para crescer. Porém, seu uso mais difundido era o de matéria-prima de cordas e velas de barco, até mesmo na África. Na Europa, o legado das verdinhas foi deixado pelos gregos e romanos. O problema é que a Europa não possui o clima adequado para seu cultivo. Isso porque o THC (princípio ativo da maconha) é uma substância produzida frente à necessidade de proteger as folhas da planta do Sol forte, assim, quanto menos Sol, menos THC. Talvez isso explique o fato de não haver numerosos registros de uso da planta como psicotrópico, já que é o THC que dá o “barato”.
Mas essa “limitação” não foi obstáculo para sua ascensão, no Renascimento, como produto agrícola europeu. A revolução de Gutemberg, produzindo a imprensa, teve seus primeiros livros impressos em folhas de cânhamo. As pinturas dos gênios da época eram feitas em telas de cânhamo. Canvas, a palavra usada em várias línguas européias para designar “tela”, é uma corruptela do latim “cannabis”. É irônico pensarmos que a América foi descoberta graças (lógico, dentre mil outros fatores) a embarcações movidas por velas e cordas feitas de maconha, como propõe o autor Rowan Robinson na obra O Grande Livro da Cannabis. Continente esse que séculos depois iria demonizá-la.
Shiva e o bhang novamente |
Com o fim da Renascença, vieram as sombras da Inquisição, quando “bruxas” passaram a ser condenadas à fogueira pela Inquisição. Essas mulheres nada mais eram, em vários casos, que curandeiras celtas que usavam plantas com poderes psicoativos. A maconha, provavelmente não estava incluída aí, mas certamente a antipatia cristã com relação a plantas que alteram nosso estado normal de consciência, nasceu aí.
A Idade Média se foi e o governo mais famoso da era moderna, o de Napoleão, teve como alvo de suas conquistas, o Egito. As razões do Imperador ainda não são muito claras, mas suspeita-se de que ele tenha invadido o país para destruir as plantações de cânhamo que havia no Egito. Foi uma estratégia inteligente porque a Inglaterra, toda poderosa dos mares da época, usava esse cânhamo para produzir as velas de suas embarcações. Napoleão foi o primeiro a proibir legalmente a erva. Os egípcios ignoraram a ordem de Napoleão e continuaram fumando sua erva. Isso virou notícia na Europa e os europeus, quem diria, começaram a copiar a moda do país africano. A forma de maconha consumida era o haxixe, uma espécie de xarope concentrado de THC. “O haxixe está substituindo o champagne”, disse o escritor Théophile Gautien em 1845.
No Brasil, o arbusto chegou cedo, provavelmente no século XVI, com a vinda dos negros de Angola. Seu uso se dava nos terreiros de candomblé, cujo princípio ativo auxiliava nas chamadas “incorporações”. Getúlio Vargas foi o primeiro a proibir o uso da cannabis, em troca da legalização do candomblé no país.
A história da maconha, como vimos, nem sempre foi rodeada por questões que diziam respeito à saúde dos consumidores. Vemos a história de uma erva e sua relação com a economia de certos países, e como isso influenciava em suas políticas. Nos próximos posts veremos questões relativas a como a maconha foi demonizada nos tempos atuais e o que está por trás da proposta da legalização, bem como os mitos e verdades que envolvem as conseqüências de seu consumo.
9 comentários:
Rss... eu acho que na verdade a cannabis nunca teve efeito medicinal, isso era o que eles diziam. As pessoas ficavam baratinadas demais para perceber a dor que sentiam acreditando que estavam curadas, o THC da planta pode ter surtido efeito opióide mas de cura... hummm, dúvido! E quantos casos mal "curados" ocorreram
sem terem sido relatados!
De toda forma ela n foi tão ruim pra humanidade né primo segundo o foi dito a respeito da comercialização da erva para fins de consumo n psicotrópico. Sobre a barganha de Getúlio tbm foi bom saber!
Po, eu também achava isso até ler sobre esse assunto. rs Eu vou postar mais textos falando sobre isso, aí a questão vai ficar mais clara pra vc também.
Mas atualmente realmente se sabe que o princípio ativo da cannabis realmente tem um certo efeito terapeutico. O princípio ativo é matéria prima para medicamentos para doenças e distúrbios, como esquizofrenia, Alzheimer e tal...Além disso, nem era em todo lugar que ela era usada por causa do efeito psicoativo. Na Europa, por exemplo, ela era usada como matéria prima para produtos como cordas, velas....como tá escrito aí no texto. Mas vale destacar também que toda droga usada no tratamento de doenças do cérebro, possuem efeito psicoativo, e quando usadas com a dosagem incorreta, produz um efeito anestésico, um "barato". Os remédios contra depressão tem um efeito parecido de "barato", deixando o paciente meio dopado às vezes, dependendo da dosagem usada. Na verdade, os efeitos malígnos são muito baixos. A exceção é o uso dela, em grandes proporções, por adolescentes. A eles sim ela pode causar danos sérios e irreversíveis. Mas assim...nem metade das coisas que popularmente se acha que ela causa, é verdade. Acompanhe os outros posts! hehe
Nos próximos então detalha como, onde e em qual proporção é livre o cultivo dela para o uso em laboratório, sobre a fiscalização desse processo, e se a legalização é para o consumo livre ou limitado! Se limitado, o governo teria controle da situação?
Valeu pelas dicas!! É exatamente isso que eu pretendo falar nos próximos posts!!
Se tiver mais dicas, sobre outros temas, pode falar! rs
Legalize já!
Olha que interessante... A história do uso, os primeiros contatos com a planta, sempre me foram desconhecidos. Que legal encontrar um histórico detalhado, ótimo post! Obrigado por compartilhar.
Valeu! Acompanha ae que tem mais um post sobre o assunto e ainda vou escrever um útlimo, sobre a questão do "legalizar ou não".
acho de estremo mal gosto alguem usar algo q pode danificar seus neronios ,digo isso porque conhesso alguem que usa muito isso e tem dficulddade de raciocinio o q antes naõ tinha.
Com certeza. A partir do momento que é sabido que algo faz mal, continuar usando é idiotice.
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