domingo, 1 de agosto de 2010

A Redenção do Maior Vilão de Todos os Tempos? (PARTE 2)

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Agora, examinando o Apocalipse, vemos que ele se refere bem menos a Satã do que nós tradicionalmente achamos. A primeira citação sobre Satã no Apocalipse se dá no capítulo 12, embora não seja óbvio de início que se trata dele. João. Em Ap 12,3, fala sobre um dragão vermelho, com sete cabeças e dez chifres e sete coroas. As características dessa besta obviamente são uma referência às 4 bestas que Daniel descreve no Antigo Testamento. Porém, Daniel em momento nenhum se refere a esses monstros como Dragões, como aparece em João. O Dragão Vermelho de João se assemelha ao monstro marítimo Leviatã, que nas traduções gregas aparecem como “Dragão”.  Agora, subitamente, encontramos um trecho falando de uma batalha entre Miguel e o Dragão, que agora aparece identificado como Satã:

 Houve uma batalha no céu: Miguel e os seus anjos tiveram de combater o Dragão.O Dragão e seus Anjos travaram combate. [...] Foi então precipitado o grande Dragão, a antiga Serpente, chamado Diabo e Satã, o sedutor do mundo inteiro [...]. [Ap 12,7-9]

 É bastante comum “antiga Serpente” ser interpretado como a Serpente que induziu Eva a comer do fruto proibido. Isso ocorre porque as pessoas tem em mente que Satã era a Serpente, mas no próprio Gênesis não existe nada que mencione essa relação entre os dois. Além disso, a relevância sobre o pecado original e todos os eventos de Gênesis, só parecem ter importância para Paulo, e nem ele atribui qualquer relação entre Serpente do Éden e Satã. Vale ainda ressaltar que originalmente um dragão era uma criatura sem pernas ou pés, sem asas, ou seja, de aspecto serpentino e possuía cabeça de cachorro ou mesmo cabeça de mulher com orelhas de cachorro. Portanto, uma serpente e um dragão eram seres idênticos nesse sentido.

Logo depois ocorre outra interrupção no texto e dessa vez nos é revelada uma outra função que Satã parece ter de dia e de noite:

 [...] Pois foi expulso o Acusador de nossos irmãos, o mesmo que os acusa de dia e de noite, diante do nosso Deus. Eles o venceram por causa do sangue do Cordeiro e por causa da Palavra do testemunho que deram, [...]. mas ai da terra e do mar porque o Diabo desceu para junto delas cheio de grande cólera, sabendo que pouco tempo lhe resta. [Ap 12,10-12]

 “Acusador” em hebraico é traduzido como “Satã”, em Aramaico como “Satanás” e em Grego como “Diabo”. Portanto, não há dúvidas sobre quem o trecho está se referindo. O que isso significa é que Satã é identificado como o ser que acusa os homens diante de Deus, o que está perfeitamente de acordo com partes do Antigo Testamento como em Jó e Zacarias. Mas é dito que a queda do Acusador já está prevista, e ela ocorrerá de duas formas:

A)     Através da batalha com Miguel (Ap 12,7-9)
B)      Sangue do Cordeiro e dos irmãos, que provavelmente está se referindo aos mártires cristãos que estão por vir.

Os estudiosos do assunto acreditam que esses dois trechos aparentemente fora de sintonia (um falando sobre a queda de Satã ocorrendo após uma batalha com Miguel e outro dizendo que sua queda ocorrerá após o derramamento de sangue do Cordeiro e dos mártires) foram uma interpolação feita posteriormente para expressar alguma mudança de opinião dos autores dos manuscritos. Tal incoerência também aparece em Paulo. Em 1 Tessalonicenses ele acreditava que Jesus retornaria ainda durante sua vida. [1Ts 4,15-17] Mas em 2Ts 2,2-3, escrito após a morte de Paulo por outro autor, a incoerência com a passagem anterior é explicada com o argumento da iniqüidade do homem.

Dessa forma, terminamos a biografia original de Satã, ou seja, vimos o que está escrito de fato nos textos canônicos. Assim, podemos resumir da seguinte maneira: Satã, ou satãs, dependendo da tradução, era uma espécie de promotor divino identificado como um dos Filhos de Deus, que além de realizar sua função no plano divino, era responsável por patrulhar a Terra testando a fé dos judeus e aplicando punições quando necessário, como um tipo de Vigário Geral de Deus. Mas uma mudança ocorre no Novo Testamento, onde parece que é anunciado que sua função parece estar prestes a ser extinta por causa da ascensão de Jesus (ou batalha com Miguel, ou sangue dos mártires), assim não mais haverá mais o Acusador. Mas uma pergunta ainda pode ser feita: mas e Lúcifer?