A busca pelo conhecimento do cérebro é algo fascinante. A década de noventa foi a década da neurociência e parece que a atual década também é dela. Aos poucos são desvendados os mecanismos cerebrais relacionados aos sentimentos, inclusive ao mais especial deles, o amor. Vários distúrbios intratáveis ou parcialmente tratáveis hoje encontram novas e melhores perspectivas de tratamento. Apesar de todos esses avanços, por mais paradoxal que seja, ainda não sabemos praticamente NADA sobre o cérebro, se formos comparar com a capacidade de manipulação infinitamente superior que alguns microorganismos possuem.
O gafanhoto, um animal aparentemente pouco complexo à nível comportamental, possui aversão à água. Nunca veremos um gafanhoto nadando assim como nunca veremos um gato num lago se esbaldando. Mas mesmo assim, vemos certo número de gafanhotos se jogando em lagos e rios. Aparentemente entrei em contradição, afinal, gafanhotos NUNCA entram na água, certo? Errado. Assim que o corpo do inseto toca na água, um verme, cerca de 3 vezes maior que o próprio hospedeiro, sai do seu abdome. É o Spinochordodes tellinii, que só consegue se reproduzir na água, que após fazer o gafanhoto de fantoche, mata-o.
Outro caso, muito mais bizarro, é o da vespa-joia, que transforma a barata americana em um zumbi. Essa vespa possui um ferrão certeiro primeiro atinge o gânglio torácico da barata, paralisando suas pernas e impedindo que ela reaja à segunda picada que atinge seu protocérebro (parte responsável pelas reações de luta e fuga, controlada pela ação do neurotransmissor octopamina, que age nos invertebrados). Ao suprimir a ação da octopamina o inseto fica numa espécie de estado de transe involuntário. Com a barata dominada, a vespa-joia pega a conduz pela antena, como se fosse um cachorro na coleira, e a leva para seu ninho. Lá a maquiavélica vespa bota um ovo no abdome da barata, através de uma abertura em seu exoesqueleto. Após mais ou menos 3 dias a larva sai do ovo e começa a se alimentar dos fluidos da barata, sem grandes danos vitais. Após vários dias a larva faz um buraco no corpo do inseto, onde cresce lentamente. Durante oito dias a hospedeira é escavada e suas entranhas, e depois, pedaço por pedaço, viram alimento. Assim, a larva vira um casulo e poucos dias depois surge uma nova vespa e o ciclo recomeça.
Vespa-joia guiando a barata como um cão |
Existe outra espécie de vespa, ainda mais sutil, que espalha o terror nas florestas úmidas da Costa Rica: a Hymenoepimecis argyraphaga. Sua estratégia é picas a aranha Plesiometa argyra anestesiando-a por um breve períodoaté que consiga fixar seu ovo no abdome do aracnídeo. Após esse processo, a aranha volta a sua vida normal e assim permanece por vários dias. Mas do nada algo estranho acontece...suas teias não mais são tecidas de maneira simetria e estendida, da forma tradicional como conhecemos. A aranha começa a tecer sua teia de maneira a formar compactos e fortificados blocos. Isso é causado pelo veneno injetado pelas larvas da vespa, que irromperam do ovo no corpo da aranha. Após tecer esses blocos de teia, uma picada fatal é investida contra o octópode. Assim, as larvas utilizam essas teias modificadas como proteção contra todo tipo de ameaças e ainda ficam com alimento garantido já que o corpo do hospedeiro ainda está ali pronto para ser devorado.
Parasita crescendo no corpo da formiga. |
Até agora vimos parasitas que agem diretamente sobre seus hospedeiros, ou seja, penetram em um inseto qualquer e o “forçam” a fazer algo. Contudo, existem alguns não tão objetivos. Antes de alcançar seu objetivo, dar origem a descendentes, eles tem um longo e arriscado caminho a percorrer. É o caso de um dos primeiros parasitas cerebrais cujo comportamento foi detalhadamente estudado: Dicrocoelium dendriticum. Esse protozoário, curiosamente, só age durante a noite. E seu hospedeiro intermediário é a formiga. Ele a infecta e como que por encanto, força-a a abandonar seu ninho (comportamento bem arriscado para as formigas, que só agem em grupo) e iniciar uma jornada até a ponta de um talo de grama. Quando finalmente ela encontra o talo, ela faz algo surpreendente: ESPERA, e espera o quanto for preciso. O que ela está esperando somente o protozoário em sua cabeça sabe. O objetivo final do Dicrocoelium dendriticum é chegar até o fígado de uma ovelha ou vaca, onde poderá se reproduzir, logo, o fato de a formiga ficar no talo, faz com que inevitavelmente em algum momento ela seja comida por esses animais. Assim, é engolido o talo, a formiga e o protozoário. E assim sua missão é cumprida.
Quando eu li pela primeira vez sobre esse tema, várias coisas se passaram pela minha cabeça. Que eu gostaria de compartilhar aqui é a seguinte: para os que acreditam em Deus, onde ele estaria nesse momento? Vou tentar ser mais claro. É comum escutar das pessoas que acreditam num Ser Superior, não necessariamente o deus judaico-cristão, que ele é bom e só criou coisas boas. A própria natureza seria uma manifestação de sua bondade moral. Pois bem, o que dizer de uma vespa que de alguma forma paralisa uma barata, coloca seus ovos no interior do corpo do hospedeiro e quando as larvas irrompem dali o devoram inteiro, aos poucos, e o pobre hospedeiro nada pode fazer para impedir isso já que está tecnicamente dopado. Será que nessa situação a barata sente algum tipo de dor? Vamos dizer que sim. Nesse caso, por que a natureza, supostamente criada por uma mente superior e infinitamente bondosa, iria criar uma espécie tão “cruel” e que é capaz de causar tanta dor e desespero à outra? Alguns vão afirmar que insetos não sentem dor. Bom, não vou dizer que isso é mentira, mas acho improvável já que os mecanismos relacionados à dor parecem ser algo bem básico à sobrevivência de qualquer ser vivo complexo. Sem dor, os seres vivos ficariam suscetíveis a quaisquer tipos de riscos. Portanto, pelo menos de uma perspectiva racional, seria coerente e inevitável que todos os seres vivos dotados de um sistema nervoso, sentissem dor.
Enfim, havendo ou não um Criador (é muito mais provável que não haja, tendo em vista o fato da Evolução) é fascinante observar como a natureza é complexa, cheia de detalhes, até mesmo naqueles seres que nós julgamos erroneamente como primitivos.
O video abaixo é a primeira parte de uma série de documentários sobre Evolução. O capítulo do video fala sobre a evolução dos animais venenosos e aparece uma longa explicação e até um video mostrando como age a vespa-joia.
O video abaixo é a primeira parte de uma série de documentários sobre Evolução. O capítulo do video fala sobre a evolução dos animais venenosos e aparece uma longa explicação e até um video mostrando como age a vespa-joia.