sábado, 28 de julho de 2012

Batman - Quando o porquê precede o como

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Por que escrever um texto sobre Batman? Simples (ou não), acredito que Batman seja o personagem – ou, pelo menos, um dos do topo da lista – fictício dos quadrinhos mais complexo que existe. A maioria dos heróis tem sua saga iniciada com um evento extraordinário e incomum, como uma picada de uma aranha geneticamente modificada, a luta por direitos iguais por ter nascido mutante, o ganho de poderes devido à exposição a uma tempestade de raios cósmicos e etc. Ainda poderíamos acrescentar o fato de que nenhuma dessas habilidades sobre-humanas conferiu o status de herói a nenhum deles. Na maioria das vezes, o que deu cabo disso foi um evento que os despertou para a responsabilidade que tinham perante o mundo por conta de suas habilidades especiais – como a morte do tio Ben, no caso do Homem Aranha (clique aqui e aqui para ler os posts sobre o herói aracnídeo). Mas com o Homem Morcego as coisas não aconteceram dessa maneira. A sua história começa com uma inversão fundamental das histórias de super heróis, em que o porquê precede o como

 Como todos já estão carecas de saber, a história de Batman começa com ele ainda criança, saindo de um espetáculo com seus pais, que são friamente assassinados por um ladrão num beco. Debruçado sobre os corpos de seus pais, Bruce promete fazer o que for necessário para que algo desse tipo nunca mais aconteça. A partir desse ponto, ele decide devotar sua vida a treinar mente e corpo para realizar seu propósito; ao contrário dos outros heróis, que primeiro recebem uma habilidade especial para depois decidirem o que fazer com ela, Batman torna-se um herói voluntariamente para depois iniciar o treinamento que o transformaria numa lenda. 
 
“E eu juro, pelo espírito de meus pais, vingar a morte deles e devotar o resto de minha vida combatendo todos os criminosos”. Versão de 1939, escrita por Bob Kane e Bill Finger. 

“Eu prometi a meus pais que livraria a cidade do mal que tomou a vida deles”. Versão da origem de Batman escrita por Jeph Loeb e Tim Sale. 

Essas são duas frases ditas ou pensadas pelo menino, em duas versões diferentes de sua origem. Repare que na primeira, Bruce jura vingar-se, enquanto que na segunda, ele apenas promete livrar a cidade dos maus elementos, sem deixar claro o método nem a motivação específicos. Mas, seguindo a linha da primeira, será que Batman realmente faz o que faz por vingança? 

Arrisco dizer que se o Homem Morcego agisse por um simples desejo de vingança, sua sede seria saciada em algum momento, ou o que ele procuraria, mais provavelmente, seria dirigir toda sua brutalidade para cima do assassino de seus pais. No entanto, não é o que acontece. Ele até chega a afirmar em uma história – que agora não me recordo qual – que o que ele mais teme é descobrir a face do assassino de sua família.
De certa forma, podemos pensar que Batman projetou seu ódio de um único indívíduo nos outros criminosos de Gotham, de modo que a face que ele tenha pouco importa, o que motivaria-o a perseguir todos os fora-da-lei de Gotham eternamente, até que eles tenham fim. 
 
No entanto, há uma série de fatores aí que pesam na hora de decidir se o que ele faz é vingança ou não. Considere o fato de que Batman possui a regra de nunca matar nem usar armas de fogo. Isso indica a existência de propósitos mais amplos do que a simples recompensa pessoal. Considere o Justiceiro, por exemplo. Frank Castle perdeu sua família assassinada pela máfia, o que o motivou a passar o resto de seus dias dedicando-se a matar criminosos. E ele não se faz de rogado, sempre que encontra um meliante não pestaneja antes de estourar seus miolos sem perguntar nada antes – a não ser que isso o ajude a chegar a mais bandidos. 

Como o filósofo Randall M. Jensen diz em um capítulo do livro Batman e a Filosofia, o conceito de punição parece ser algo mais coerente no caso do morcego. Ele não sai pela cidade simplesmente colocando medo e predendendo marginais, mas punindo-os por seus atos imorais. No entanto, essa resposta ainda não é o suficiente para saciar nosso desejo de conhecer as motivações do Cavaleiro das Trevas. Afinal de contas, a morte de um ente querido seria o suficiente para motivar uma criança a seguir a árida estrada até se tornar um vigilante mascarado tão devotado quanto Batman? Com certeza esse é um dos ingredientes dessa receita, mas existe um componentes fundamental sem o qual todos esses eventos e pensamentos não teriam liga para formar o que conhecemos pelo encapuzado herói: a promessa. Acima de qualquer coisa, Bruce Wayne vive sua promessa feita no passado de uma maneira inconcebível para a maioria de nós. E esse pode ser o componente essencial de sua incorruptibilidade e persistência tão temidos pela vilania e bandidagem de Gotham.