sábado, 13 de outubro de 2012

Resolvi ler Paulo Coelho

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Às vezes é bom fazermos coisas diferentes das quais costumamos fazer rotineiramente. Algumas vezes é dolorosa e incômoda a experiência, afinal, não é muito confortável sairmos de nosso ambiente conhecido e nos aventurarmos por territórios nunca antes explorados. Isso vale para tarefas realmente físicas e para as psicológicas. Pois foi o que tentei fazer, me aventurei a ler Paulo Coelho, autor para o qual sempre olhei um tanto de lado por escrever livros sobre bruxaria, crenças em geral, esoterismo e etc, sempre que via minha mãe e meu pai lendo seus livros – tenho quase certeza que eles tem todo.
Sempre enxerguei o cara como um esotérico doido desses que saem por aí falando de energias, poder do pensamento e coisas bem típicas desse pessoal – como o indiano Amit Goswami que insiste em falar certos impropérios sob o aval da ciência. Tenho más experiências com isso. Entretanto, muito inesperadamente, um dos sites que tem o podcast que eu mais gosto – o Jovem Nerd – gravou um programa exclusivo com o autor. Achei tão inusitado que nem tive o que pensar direito – nem críticas nem elogios, somente a curiosidade se instalou. 
Azaghal, Paulo Coelho e Eduardo Spohr, retirado do blog do autor

Tentei ouvir o mais desprovido de preconceitos possível e o resultado foi que achei ele tudo, menos um desses esotéricos malucos e deturpadores da ciência. Assim como Eduardo Spohr, um dos participantes do podcast, Paulo Coelho parecia saber separar muito bem aquilo que é objeto científico daquilo que não tem a ver com esse tipo de estudo: o simbólico. E isso me impressionou. Assim como Joseph Campbell – famoso mitólogo que esbanjava erudição e sabedoria – Jung e Mircea Eliade (estou devendo ler alguns livros desses dois últimos), o autor parecia ser bem sábio e culto ao mesmo tempo (ficou interessado? Ouça esse podcast excelente sobre os 3 no Mitografias)

Essa foi a centelha que me despertou para a possível utilidade de um dia pegar e ler seus livros. Mas ainda assim, me senti um tanto resistente depois e demorei mais de um ano para ter coragem de ler algo dele. Resolvi pedir à minha mãe que me emprestasse sua coleção. Estava atrás de seu primeiro livro de grande circulação: O Alquimista . Não achei então, comecei O Diário de um Mago.
 
De fato, me surpreendi. O livro mantém o mesmo tom do autor: sereno, erudito e sábio – bem que o Jovem Nerd e Azaghal falaram que para conhecê-lo bastava ler seus livros. Claro que ele aborda muitos assuntos que para mim são uma questão de metáfora, de simbolismo, como questões às vezes que beiram o literal – apesar de eu ter ficado em dúvida sobre se nas partes em que demônios e espíritos aparecem, se na verdade não trata-se tudo de uma questão psicológica mesmo, bem aos moldes do que diriam Campbell, Jung e Eliade. 


Mas, o que me prendeu, foi a simplicidade da estrutura da narrativa, e de como isso conseguia, ao mesmo tempo, transmitir intrincadas e vertiginosas reflexões sobre os mais diversos assuntos. É engraçado, mas há um tempo venho tentando me dedicar à literatura e à experiência do zen budismo, e esse livro pareceu “materializar” em uma história de ficção muito do que eu já andava lendo, inclusive essa simplicidade do homem comum, que é onde encontra-se a verdadeira sabedoria. Além disso, a obra fala sobre o Caminho, algo que é bem constante na literatura zen budista, e que li longamente nos livros de Joseph Campbell, principalmente em O Herói de Mil Faces

Por último, sem me alongar tanto, gostaria de falar mais duas coisas. A primeira, é que ouvi muitas pessoas dizerem que Paulo Coelho era plagiador. Bom, pode ser, mas o que percebi foi que ele aborda temas clássicos em todas as mitologias e religiões, e mesmo na filosofia grega. Isso implica no fato de que as próprias religiões vivem se repetindo em seus temas essenciais, apesar às vezes a metáfora não ser a mesma: como exemplo posso itar o próprio arquétipo do herói que morre e depois renasce, seja literal ou simbolicamente, como Jesus, Ulisses, Mitra e Hórus, só para citar alguns. Então, pela natureza do tema abordado, essa repetição – confundido com plágio – foi natural, talvez necessária também. 

E, por último, queria dizer uma hipótese minha. Acho que para ler Paulo Coelho é preciso ter olhos para isso. Quero dizer que não adianta pegar o livro cheio de idéias preconcebidas e aplicá-las ali. Por exemplo, não adianta sair dizendo que essa história de Caminho não existe porque não foi comprovado cientificamente, ou que as entidades que aparecem ali não existem pelo mesmo motivo. O livro dá a entender o tempo todo que trata-se tudo de uma experiência psicológica, e não factual, empírica no sentido de os objetos que a ciência estuda.  É uma experiência pessoal e psicológica. Nesse sentido, acho que ler os livros do Joseph Campbell me ajudaram muito. Aliás, eu recomendaria que todos lessem Joseph Campbell pois é uma bela introdução à religião e, inclusive, serviria para que muitos religiosos fundamentalistas deixassem de cometer o erro de entrar em guerra contra a ciência em nome de seus dogmas, afinal, cada uma está destinada a uma esfera de estudo. A religião não pode dizer nada sobre biologia ou cosmologia, e, ao mesmo tempo, a ciência também não tem como dizer nada sobre o simbólico, sobre o conteúdo desse tipo de experiência religiosa.