Vivemos
tempos em que a religião, embora não vivamos em um Estado teocrático, vem se
espalhando de maneira silenciosa (nem sempre) pela política, pelos assuntos
pessoais do dia-a-dia; enfim, o que falta para chegarmos a uma teocracia de
fato? Vemos símbolos religiosos em órgãos públicos, ensino religioso em escolas
públicas, políticos competindo por determinado cargo tendo como base para
derrubar seu rival sua não-crença em Deus...Bom, isso não me parece algoque
deveria haver num Estado que, constitucionalmente, se diz laico. Mas, talvez,
todos esses disparates sejam só o começo. Paralelamente, me intriga o fato de a
nossa Constituição fundamentar a laicidade do Estado e, ao mesmo tempo,
conceber o direito de escolas públicas suportarem o ensino religioso. Será isso
um disparate que depõe contra os ideais seculares?
O termo laico vem do latim laicus, que significa leigo, no sentido de secular, isto é, não
religioso (SILVA, 1997, p. 45). Trocando em miúdos, um Estado laico deve ser
aquele que se declara leigo perante a religião, dando liberdade para seus
habitantes exercerem à vontade seus credos, mas não se posicionando de forma
alguma em relação a nenhum deles. Fácil, não? Mas parece que o velho jeitinho
brasileiro de burlar regras arrumou um jeito de driblar isso. Quem nunca viu um
tribunal com um crucifixo pendurado? Eu já, e eu trabalho em um órgão federal.
Vimos nas
últimas eleições presidenciais, disputas acaloradas entre Serra e Dilma, em que
os dois começaram a competir para ver quem conseguia frequentar mais missas e
mais cultos evangélicos para conquistar seu eleitorado. É como se quisessem
dizer: “olha só, estouindo à Igreja, vê? Isso signfica que sou uma boa
pessoa!”. (Veja mais )
O Ensino
religioso talvez seja o motivo de queixa mais antigo dos adeptos do
secularismo, como eu. A diferença é que, paradoxalmente, o ensino religioso é
previsto na Constituição! (art. 210, parágrafo 2º) Esse ensino se dá de
maneira facultativa no Ensino Fundamental, nas escolas públicas. Mas o Estado
não é laico?
Esse
aparente paradoxo pode ser virado a nosso favor, dos secularistas, se usarmos
essa opção para ensinarmos a religião de uma forma diferente da que se ensina
agora. Não tenho muitos dados sobre isso, mas na maioria das vezes a religião é
passada para os alunos na forma de desenhos bíblicos, a aprendizagem de
musiquinhas, orações e por aí vai (Leia Minha Filha e o Ensino Religioso). Esse conhecimento vem de alguns
textos que já li e da minha própria experiência, já que cursei o Ensino
Fundamental em um colégio (muito bom) que tinha diretores católicos, logo, o
ensino religioso era um bônus do qual não
se podia escapar. E eram exatamente essas musiquinhas e outras coisas
que éramos obrigados a aprender.
E não
adianta dizer que isso seria muito para a cabeça dos crianças. No Ensino
Fundamental já é ensinado História Geral e do Brasil, não seria um salto muito
alto se fosse ensinada também uma disciplina nos moldes de uma História das
Religiões. E o lucro de uma medida dessas talvez seja altíssimo! Quanto mais
ampliarmos os horizontes de nossas crianças, mais vamos mostrar a elas que o
mundo é algo muito maior e mais complexo do que suas renças pessoais e, muitas
vezes, egoístas. Temos que formar cidadãos que tenham capacidade de escolher,
de fazer valer a liberdade dada pela Constituição. É muito fácil dar essa
capacidade e disponibilizar somente uma opção.
Referências:
SILVA. De Plácido. Vocabulário Jurídico. 12ª ed. v.
III, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1997.
Bibliografia
Consultada:
Gustavo Milaré · 711 semanas atrás
Felipe C Novaes 57p · 711 semanas atrás
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