Que eu
lembre, foi a partir do Ensino Médio que eu comecei a desenvolver um raciocínio
científico um tanto apurado, se for comparar com a maioria das pessoas da minha
idade. Não que antes eu já não me interessasse pelo assunto, mas penso que foi
nessa época que eu me senti mais confiante para analisar coisas que
eventualmente lia ou ouvi por aí, inclusive dos próprios professores.
E nessas
reflexões, algo que sempre ficou claro – e que foi ficando mais ainda com o
tempo – é que existem duas formas de abordar ciência em sala de aula: a
primeira, diz respeito ao ensino das descobertas da mesma através das
disciplinas. A outra versa sobre o uso prático da estrutura de pensamento
científico em sala de aula. O que isso quer dizer?
Um professor
de biologia, por exemplo, pode ter muitos conhecimentos sobre o assunto,
ensinar muito bem a matéria, mas não conseguir – ou não ter interesse – em
fazer com que os alunos incorporem a forma de pensar científica, que é o que
produz os resultados das pesquisas em biologia. E, também obrigatoriamente, o próprio
professor deve dominar essa habilidade.
Já tive
ótimos professores em todas as matérias. Um de física, uma vez, iniciou uma
aula dizendo que o que ele explicaria nesse dia, seria provavelmente a causa de
um monte de fenômenos do cotidiano que nós achamos impressionantes, mas não
sabemos explicar. Não lembro mais qual era o assunto, mas a conclusão dele no
final das contas foi que quando estamos pensando em determinada pessoa e do
nada ela nos liga, isso é um fenômeno explicado por essa propriedade que ele ensinava.
Caro leitor,
você provavelmente lembra – um tanto vagamente, dependendo da idade – dos
assuntos abordados na física escolar. Algum desses assuntos parece ser uma boa
explicação para qualquer um desses fenômenos estranhos do dia-a-dia? Eu acho que não, e na
época expressei minha opinião. O professor mostrou que era um bom professor para
aquelas matérias, mas estava totalmente desatualizado com as mais modernas
teorias da Física, pois nunca tinha ouvido falar em Teoria das Cordas, por
exemplo. E ele também parecia ensinar uma ciência mas não saber exatamente como
procede uma pesquisa científica. Isso não é nada escabroso, na verdade, é até
comum; o que não significa que não deva ser diferente.
Outra forma
de manifestação da ciência em sala de aula, é através dos métodos de ensino e
aprendizado. Como destaca um artigo que li recentemente na Scientific American, a maioria dos alunos estudam lendo anotações ou livros e sublinhando com
marca-texto os trechos mais importantes. Na hora de estudar para a prova, o
aluno dá uma relida nas partes sublinhadas, supostamente as mais importantes e
dignas de serem decoradas.
Eis a
conclusão do artigo:
Pesquisas mostraram que destacar e reler textos estão entre as maneiras menos eficazes de os alunos se lembrarem do conteúdo que leram. Uma técnica muito melhor é fazer uma dinâmica em grupo. Em um estudo, alunos que leram determinado texto uma vez e tentaram lembrá-lo em três ocasiões tiveram notas 50% maiores nas provas que alunos que leram um texto e depois o releram três vezes. E ainda assim muitos professores insistem em encorajar – ou pelo menos em não desencorajar – as técnicas que a ciência provou ineficazes.
Esse é o
reflexo de algo cotidiano, para quem tem olhos para ver: alunos saem do colégio
empanturrados de conhecimento engessado, isto é, se alguém fizer uma pergunta
diferente da qual ele está acostumado para dar determinada resposta, o aluno
errará, pois ele não domina o princípio que guiou a obtenção daquele conteúdo.
Inclusive, é o que Richard Feynman denuncia no ensino brasileiro, conforme
relata um capítulo do livro Está brincando Sr. Feynman?. O episódio conta a
vinda dele no nosso país para dar palestras numa universidade. Lá o físico
propõe que a plateia de alunos de física resolvam alguns problemas cotidianos,
mas, para sua decepção, todos só sabem repetir equações, fórmulas e aplicá-las
a problemas típicos de provas. Incapazes de pensar em fenômenos cotidianos de
forma científica e reflexiva. É como se os estudantes brasileiros fossem
ensinados a se comportarem frente ao conhecimento como concurseiros: decorando
informações factuais e condicionando-se a dar a mesma resposta à dado tipo de
pergunta. De fato, enquanto isso prevalecer, não seremos um país líder em
formação de cientistas.