segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Como o mundo virou o palco dos extrovertidos?

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Um homem tímido sem dúvida teme a atenção de estranhos, 
mas dificilmente pode-se dizer que tem medo deles. 
Ele pode ser ousado como um herói na batalha e mesmo assim não ter 
autoconfiança em relação a um herói na 
batalha e mesmo assim não ter autoconfiança em relação
 a frivolidades na presença de estranhos.
- Charles Darwin

Belíssima frase do gênio Charles Darwin. Me identifico com ela tremendamente, e acho que isso acontece com muitas pessoas hoje, que é um tempo em que a extroversão é o traço de personalidade cobiçado. Os quietos – introvertidos – parecem ter perdido seu lugar, ou melhor, parecem ter seu lugar apenas nos cantos escuros da estranheza. Tente começar um papo mais reflexivo e demorado num grupo de amigos, em qualquer ocasião, e na maioria das vezes a resposta será algo como: “Caraca, isso é hora de pensar sobre isso?”. Bom, eu devolveria, mentalmente, a questão: “E quando é que vc se sente preparado para falar desse tipo de assunto? Porque parece viver só para baladinhas, álcool, futebol e fofocas de celebridades...”. Ou, ainda, experimente se comportar de forma mais reservada numa festa: será logo acusado de “lerdeza”. 

Certamente cada um de nós pode ser analisado em busca do motivo pelo qual nos tornamos – eu não – tão superficiais, mas um outro plano de análise nos oferece essas razões sob um panorama geral, mais social. Susan Cain, a autora do ótimo livro O Poder dos Quietos  nos oferece explicações sobre essas duas esferas. Certamente tenho muito o que falar desse assunto, afinal, sou um introvertido nato que vez ou outra se indigna com um mundo regido pela extroversão ditatorial. No entanto, neste post tentarei traçar as possíveis causas socio-culturais dessa tendência atual. 


O culto à personalidade como substituto do culto ao caráter
Nem sempre a sociedade foi tão sedenta por extroversão. Antes da urbanização, quando a maior parte da população vivia no campo, as coisas eram diferentes. Imagine viver numa fazenda onde você terá a chance de conhecer apenas – se chegar a tanto -  poucas dezenas de pessoas. O que acontece nesse tipo de ambiente é que as pessoas possuem muito mais chances de se encontrarem mais de uma vez (veja como encontros repetidos molda nossas escolhas em contextos sociais) e dividirem suas experiências profundas sobre a vida e tudo o mais. Mesmo que o grau de instrução não seja dos mais elevados, a convivência propiciará um bom grau de elaboração de considerações profundas sobre as coisas, e isso será dividido com os poucos amigos existentes ao redor.

O ritmo ali também não é dos mais rápidos, isso implica numa maior quantidade de tempo livre para empreender esses bate-papos contemplativos. As relações de trabalho ali também eram um pouco diferentes. Os indivíduos precisavam confiar nos empregados, o que só era alcançado com a convivência, através de demonstrações de moralidade e bom caráter. E havia tempo para isso. Dessa forma, não importava se você era calado ou falastrão, simpaticíssimo ou do tipo mais reservado e sério.

Com o surgimento das cidades, esse mecanismo que regia as interações foi sendo modificado aos poucos em virtude das próprias necessidades desse novo meio. As cidades foram crescendo e o campo, se esvaziando.

Das relações de trabalho à vida pessoal
Como um empregador de uma empresa ou de um estabalecimento comercial, por exemplo, selecionaria seus empregados? Lembre-se de que os critérios para contratar alguém continuaram sendo os mesmos. O sujeito que tinha que ser confiável e moral, no entanto, um comerciante ou um rico empresário não teriam tempo hábil para conviver com aquela pessoa e descobrir se ela era digna ou não, sentia-se necessidade de um modo mais rápido, afinal, “tempo é dinheiro”.

Assim, uma pessoa bem vista deveria ser aquela capaz de demonstrar mais rapidamente “quem ela era”. E como todos queriam ser bem quistos, a superficialidade (falar o mais rápido e superficialmente sobre um assunto era bom, afinal, era preciso mostrar seu know-how rápido e eficientemente), a alegria (você teria que demonstrar que é uma pessoa de bem com a vida, sorridente, capaz de atrair clientes e impressioná-los com um novo produto) e etc, foram priorizados. 

E foi dessa forma que acabamos embarcando nesse caminho. Claro que nem todas as pessoas extrovertidas são superficiais ou fúteis. Não é o que estou tentando dizer, mas sim que os valores que regem as relações hoje, para além das de trabalho, são as que estão dentro deste pacote da extroversão. Quer ver uma coisa? Tente puxar um assunto que necessite de mais reflexão no seu grupo de amigos ou mesmo com a família. Provavelmente, se as pessoas corresponderem ao seu chamado, elas se deterão no assunto por no máximo uns 3 minutos. Qualquer um que tente prolongar ou aprofundar a coisa será “o chato”. 

Já passou por essa experiência? Qual dos dois tipos de pessoas você era, a extrovertida ou a introvertida? Se for do segundo tipo, é provável que já tenha sido chamado de lerdo, certo? (hehe)

Mas será que só a sociedade tem o poder de moldar as pessoas dessa forma? Bom, como vimos em outros posts, o ser humano não é uma tábula rasa, então, existe uma interação entre nossa biologia e o ambiente (ver textos Inato e Aprendido 1 e 2). Por isso, no próximo post, abordarei um pouco da questão biológica que envolve esses dois traços.