sábado, 15 de junho de 2013

Cortados pela Guilhotina de Hume - Marina Ruy Barbosa e Paes

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Recentemente, a atriz Marina Ruy Barbosa se envolveu numa polêmica ao dizer em entrevista que “é difícil mulheres rodadas encontrarem um cara legal”. Logo depois, em sua página de uma rede social, Nana Gouveia, diz:
"Ah! Como eu quis dizer essas palavras quando li o que essa garotinha mimada, preconceituosa e que não sabe absolutamente nada da verdade da vida falou nessa tal entrevista. Marina Ruy Barbosa: 'Criança, suas palavras foram de uma ignorância machista sem dimensões. O que você mostrou com seus comentários foi tão somente que você deseja que as pessoas que lhe considerem uma puritana". 
Fiquei sabendo dessa história ao ver no facebook várias moças que se consideram feministas, criticando a atriz. Diziam, basicamente, o que a própria Nana disse, que Marina era preconceituosa e machista. Pensando na atual linha de raciocínio que as pessoas estão seguindo, a opinião de Marina realmente foi bem retrógrada, principalmente considerando sua idade. Mas acredito que a coisa não seja tão fácil de criticar quanto as feministas acreditam. Existe uma diferença essencial entre o ser e o dever ser que muitas críticas acaloradas e passionais deixam de considerar. Essa diferença consiste em deixar claro que às vezes nossa opinião toma por base aquilo que a sociedade faz, outras, o que a sociedade deveria fazer. 

Considero a afirmação de Marina legítima, ou seja, na maioria das vezes, homens confiam menos em mulheres “rodadas”, no que diz respeito à desenvolver um relacionamento mais sério. Digo isso não só de boca, mas por ser homem e ter vários amigos que já confidenciaram pelo menos certa relutância em ter algo mais sério e assumido com mulheres com posturas que podem ser classificadas como “rodadas”. Não que não considerar sua virgindade ou sexualidade um cálice sagrado inviolável e reservado ao príncipe encantado seja algo essencialmente recriminável, ou que tenha relação direta e inequívoca com a incapacidade de levar um relacionamento sério. Mas, infelizmente, é essa a primeira questão que surge para o homem próximo desta. Isso não é a emissão de um julgamento moral, é somente uma análise sobre o que costuma acontecer nesses casos. 

Além disso, esperava que as feministas agissem de outro modo nessa situação. Não são elas que pregam a igualdade? Não acham que as mulheres tem o direito de escolherem o que fazer com seus corpos? E se Marina escolheu viver de uma forma conservadora? Ela deveria ser criticada?

Isso é o que chamo de ser. Agora, como deveria ser? Deveríamos ter discernimento o suficiente para saber que esse comportamento feminino não garante que as mulheres não sejam capazes de casar e serem fiéis, por exemplo. O mesmo serve para o homem. As pessoas deveriam pensar desse modo e não desenvolver preconceitos. Mas nem tudo é como gostaríamos que fosse.

Como eu disse, esse tipo de confusão é própria de pessoas muito engajadas pessoalmente em alguma coisa. Se comportam assim quando algo ofender seus brios pessoais também.
Um exemplo bom e que todos podem se lembrar foi a repercussão do filme Tropa de Elite. A história se passa sob o ponto de vista da BOPE, o batalhão de operações especiais da polícia militar do Rio de Janeiro. Eles lidam com a corrupção dentro da polícia e com a bandidagem que assola o estado. Como esperado, o filme é extremamente violento, mostrando policiais batendo e matando bandidos, e falando deles – e dos policiais corruptos – como a escória da sociedade. O pessoal dos direitos humanos e simpatizantes acharam o filme horrendo. Trataram-no como uma incitação ao ódio, como se quisesse convencer a alguém de que esse é o modo correto de se agir. Ora, o que esperavam de um filme sobre o BOPE? Policiais bonzinhos, distribuindo doces para traficantes?

Aqui, o problema se repete. O filme é extremamente feliz em mostrar como se dá a luta contra o tráfico, do ponto de vista de militares. É assim que as coisas acontecem para eles. O filme em momento nenhum revela-se um dever ser, isto é, ele não diz que as coisas devem ser assim.

Outro caso recente em que podemos apreciar essa lógica – ou falta de – foi o conflito entre o prefeito Eduardo Paes e o cantor Bernardo Rinaldo Botkay. Ao que as notícias indicam, o músico desferiu uma série de ofensas contra Paes, que estava jantando em família, num restaurante. O prefeito descontrolou-se e deu um soco no rosto do músico.

Os críticos do governo Paes logo alardearam: “Ele é prefeito, e como tal, não poderia de jeito nenhum agir dessa forma! Está errado!”. Já os que são a favor tenderam a ressaltar o fato de trata-se de um ser humano, não só de um prefeito, e seres humanos se descontrolam de vez em quando. Eu, assim como outras pessoas que conheço, não sou um partidário do governo Paes, mas também reconheci que apesar de ele ter um compromisso de maior importância com a cidade, sua reação foi erradíssima. Não recomendaria igual atitude nunca. Entretanto, os defensores tem certa razão, Paes é um ser humano!

Agora, trazendo para a formulação que venho fazendo, considero que os críticos estão ressaltando algo que deveria ser: Como prefeito, automaticamente ele NUNCA deveria se comportar de tal forma. Mas, o que colocaríamos na categoria de ser, daquilo que ocorre na prática? Estaríamos falando de um prefeito, mas ainda assim de um ser humano, e todos sabem que seres humanos podem perder a cabeça por descontrole emocional. O cargo de prefeito do Rio de Janeiro não inclui nenhum treinamento com monges budistas para que seja exigido um controle emocional incomum.


Essa diferença entre o ser e o dever ser é uma interessante confusão que todos nós estamos preparados para cometer, justamente porque o componente emocional próprio de certas polêmicas nos cega para a visão mais nítida dos fatos – por mais que uma visão nítida nunca esteja totalmente desprovida de nossa cor pessoal. Em filosofia, essa falha é chamada de Guilhotina de Hume, em homenagem ao filósofo David Hume.