Fevereiro está sendo um mês movimentado na internet graças à
entrevista do pastor Silas Malafaia no programa da jornalista Marília Grabriela. Não
me supreendi com nada que aconteceu ali, até mesmo o óbvio descontrole da
apresentadora foi esperado, afinal, é difícil encontrar alguém que sobreviva
serenamente às táticas e falas do pastor. Além de seu tom de voz agressivo e
fala ininterrupta que constantemente interrompe o interlocutor, seus argumentos
em si são tão radicais que é complicado manter a imparcialidade.
Num desses tópicos, um colega que eu nem sabia que era
protestante, vulgo evangélico, veio dizer que se olharmos por certo ângulo,
Malafaia está certo. A linha argumentativa era: ele é evangélico, acredita
piamente na Bíblia, o livro condena os homossexuais e diz que Deus criou homem
e mulher e acabou; portanto, é compreensível que o pastor pense que os
homossexuais são aberrações e que sejam fruto de uma mera escolha pessoal ao
invés de ter uma orientação definida – ao menos parcialmente – geneticamente (Veja um post que já escrevi argumentando contra essa idéia de escolha sexual propagada pelo Silas Malafaia).
Sim, meu colega está certo, essa é a base do pensamento do
Malafaia. Todavia, não compreendi o motivo pelo qual ele acha que a opinião do
ilustre entrevistado de Marília Gabriela deve ser simplesmente aceita. Seria a
mesma coisa eu falar assim: Olha,
pessoal, o Hitler comandou a morte de milhões de minorias sociais, socialistas,
eslavos e judeus porque ele se baseava na eugenia e em mitos como do homem
ariano, descendente direto do Thor e tal. Então, por esse ângulo, ele está
certo! Deixem-no em paz!
Risível, não? Pois é! Outra linha de pensamento que ouvi
muito foi: “Vivemos num país democrático,
livre! Então, temos o direito de viver como bem entendemos e de falar o que bem
queremos.” Bom, tirando meus conflitos com essa idéia de “ter direito a”,
esse argumento segue o mesmo padrão do anterior, e isso é um problema. Vivemos
num país democrático e livre, correto. Mas é justamente por isso que o Malafaia
pode ter a pachorra de ir na televisão falar absurdos! E é justamente por
vivermos sob esse prisma é que as discussões são possíveis – e desejáveis. O
fato de a posição do pastor poder ser explicada ou de habitarmos um local que
permita que sejamos livres ideologicamente não significa que o debate deve ser
banido e nem que suas opiniões devam ser justificadas! Resumindo: não podemos
sair por aí falando qualquer coisa e achando que não podemos ser contestados.
Outro quadro com o qual muito me defrontei foi o da falácia naturalista. Essa falácia fala
basicamente da alegação de que se algo é
natural, é também correto moralmente. Percebe a diferença? Temos, por
exemplo, o comportamento violento. TODAS as espécies possuem comportamento
violento e também comportamentos altruístas. Cair na falácia naturalista seria
afirmar que a violência é um comportamento correto porque outras espécies, além
da humana, o possuem. O mesmo aconteceu com a homossexualidade. Eu disse que a
homossexualidade não poderia ser fruto da escolha individual porque outras
espécies também apresentam esse comportamento. Daí, falaram: “Ah, mas não é porque outras espécies fazem
algo que deveremos fazer também! Se for assim, vamos matar uns aos outros
porque os animais também o fazem!”. Não! O que quis dizer é que somente não
podemos afirmar categoricamente que orientação sexual trata-se de escolha
voluntária e que não existe base genética, afinal, outros animais – que não
possuem o notável poder voluntário que nós – também possuem práticas
homossexuais em seu repertório comportamental (Veja aqui o vídeo que Eli Vieira fez rebatendo essa visão do Silas).
Finalmente, abordarei brevemente um dos argumentos mais
usados contra a Evolução, o de que ela é
só uma teoria. No senso comum, usamos a palavra “teoria” para nos referir
a alguma informação ou conjectura que não é fato, que não é comprovada sob
nenhuma forma de julgamento. É mera suposição. No meio científico, teoria é a
hipótese que foi corroborada por evidências. Por exemplo, você desconfia
que seu cachorro esteja pegando seus chinelos, pois eles andam sumindo. Você
supõe que o animal seja o agente nessa situação, mas não tem como comprovar,
então, isso é uma hipótese. Se você um dia filmar ele fazendo isso, então
existe uma evidência que apóia sua hipótese; pronto, você tem uma teoria, a de
que seu cachorro está roubando seus chinelos.
A maioria dos religiosos distorce esse raciocínio dizendo “Ah mas a evolução é só uma teoria” para
que o ensino do criacionismo – que nem ciência é – seja visto com bons olhos.
Mas eles parecem não saber – ou ignorar convenientemente – que até mesmo a
gravidade faz parte de um corpo de idéias e evidências bem estudadas chamada
teoria gravitacional. A causa dos terremotos é causa pelo movimento das placas
tectônicas, mas essa explicação também é uma teoria, assim como o é, a idéia de
que a Terra gira em torno do Sol. Você vê alguém questionando esses fatos? Eu
também não.
Existem muitos argumentos falaciosos a abordar, mas esses
são os principais. Lendo isso você estará preparado para entender e até refutar
os argumentos centrais dos religiosos que radicalizam sua crença e querem
transformar religião em História e Ciência. Como eu disse no recente post em
que eu descrevo meu ateísmo, os conflitos entre religião e ciência são causados
por religiosos como Malafaia, que deixam de enxergar as belas metáfora sque as
religiões nos fornecem e passam a tratá-la como uma enciclopédia.