É a primeira vez que opino publicamente por aqui sobre algum
filme de herói. Sou fã incondicional de quadrinhos, daqueles que vai ao cinema
prestigiar a adaptação mesmo sabendo que pode vir uma bomba pela frente – como
veio nos dois filmes do Motoqueiro Fantasma.
Por que resolvi fazer isso só agora? Não sei ao certo. Uma
das minhas hipóteses é que eu fiquei tão estupefato com os últimos filmes da
Marvel e da DC, que me senti até inibido ou bloqueado para escrever algo. Mas,
bom, isso é sobre porque eu não tinha escrito antes, mas não responde por qual
motivo fiz agora. Defendo a ideia de que Homem de Ferro 3 foi um filme
empolgante – seria impossível não ser com o Robert Downey Jr. – mas que teve
falhas e excessos que me fizeram respirar e analisar a coisa um pouco longe do
calor escandante de “marveteiro”.
Este é um texto sobre o terceiro filme, então, só direi
brevemente que simplesmente adorei, venerei o primeiro filme. Não foi um Batman Begins da vida, mas dentro da proposta da Marvel de trazer filmes com mais ação para um público mais jovem e descompromissado com a seriedade tensa, foi uma verdadeira epifania. Conseguiram
popularizar um personagem antes bem escondido e fizeram-no ser a peça-chave em
Vingadores. No primeiro, vemos o egocêntrico,bon vivant , empresário e gênio,
entre outras coisas, ver o que sua postura despreocupada e negligente estava
fazendo: criando organizações terroristas e dando meios para que lunáticos ao
redor do mundo (inclusive os próprios americanos) fizessem mais e mais vítimas
inocentes pelo globo. Apesar de ter acordado para esse fato, vemos que ele não
mudou tão profundamente, continuando a viver normalmente à base de mulheres e
muito rock’n’roll, mas pelo menos tentou fazer algo para consertar essa mancada: criou a primeira armadura.
No segundo, vemos MUITO mais do mesmo...com o ego do playboy
ainda mais nas alturas graças à sua armadura que conferiu poder e mais fama. E,
de novo, e ainda mais espalhafatosamente, vemos um empolgante e catártico filme
regado à ACDC e Black Sabbath.
O que temos no terceiro?
Cadê a trilha sonora do ACDC e Black Sabbath?! Substituíram o rock
pauleira por umas baladinhas. Imaginando o filme como uma grande, barulhenta e
luminosa orquestra, as músicas alucinantes da banda eram o maestro, aquele que
ditava o ritmo do filme. Então, pelo menos parte do ritmo já foi perdido.
A grande virada (spoiler)
A história do filme foi bem legal. Se basearam no arco
Extremis, cuja premissa é bem parecida com a usada no filme, e acrescentaram o
mega vilão Mandarin. Eu nunca fui leitor assíduo de Iron Man, mas sempre soube
que o Mandarin era um dos grandes vilões da Marvel, aquele que com poucos
poderes, somente usando de discurso, influência e chantagem, consegue mover
mundos e fundos para pirar a cabeça do herói. SPOILER Daí, o que fazem no
filme? Substituem o sino-americano por um ator americano, que se caracteriza
como uma espécie de afegão exótico, admirador de outras culturas ao redor do
mundo. Genial, afinal, cai muito bem no nosso mundo de hoje um inimigo que nos
lembre Osama Bin Laden. No momento de virada do filme, entretanto, descobrimos
que o perturbador terrorista é nada mais que um ator contratado pelo empresário
por trás da tecnologia Extremis – um nerd que no passado foi humilhado pelo
Stark, interpretado por Guy Pearce.
Ok, isso poderia ser muito bom ou muito ruim para o filme. Achei essa virada na história genial, apesar de ter desonrado o personagem no final das contas, mas tudo bem. Foi um recurso usado medianamente. A grande questão que não ficou tão
clara na película foi a motivação do verdadeiro vilão, interpretado por Guy Pearce. Por que
ele se importava tanto em incomodar os EUA? Tá, ele era um terrorista, mas até
terroristas tem motivações.
Os super soldados luminosos
A tecnologia Extremis em si não foi tão bem aproveitada como
nos quadrinhos. É curioso como nas revistas a coisa foi apresentada de uma
maneira muito mais séria e sombria, sem aquele estardalhaço luminoso do filme.
Só uma palavra defende isso: desnecessário. Todos aqueles caras flamejantes
poderiam ter sido substituídos por caras mais críveis, com o corpo praticamente
indestrutível e que só sob muita pressão – e porrada – exibissem aquele visual
vaga-lume. Nas revistas, fiquei até com a impressão de que o cara transformado se comportava um pouco como os zumbis de Extermínio, com trejeitos que lembravam uma contaminação por raiva e etc. No filme, pareceu que além da indestrutibilidade as pessoas adquiriam também habilidades para luta, que foi o caso da Pepper, que no final sentou a pua em todo mundo.
Transformação da primeira cobaia para o Extremis. O cara fica parecendo mais um zumbi do filme Extermínio do que os vaga-lumes de Iron Man 3. |
Aliás, foi bom falar nesse aspecto exagerado e pouco sério,
pois acho que esse foi um recurso bem usado nos outros filmes, mas nesse virou
uma verdadeira galhofa. O último da trilogia deveria ter sido uma mudança de
paradigma que marcaria os novos caminhos do próximo filme dos Vingadores. Stark
estaria abalado pelos eventos recentes...seu ego teria recebido um pesado golpe
ao descobrir que não estamos – ou que ELE não está – sozinhos no Universo, que
dividimos o Cosmos com deuses, alienígenas e outros super seres. Frente a potenciais ameaças
como os asgardianos e o próprio Hulk, sua armadura talvez não garantisse mais
tanto assim a segurança de seu mundinho, daí a louca e compulsiva construção de armaduras. Fora o crescimento da
responsabilidade, ao ser um membro dos Vingadores, uma equipe criada pela
S.H.I.E.L.D. para ser o último recurso terráqueo contra ameaças que ninguém mais
pudesse fazer frente. Isso poderia ser levado para um lado bem decadente e
sombrio, digno de um filme que deveria explorar a queda e ascensão de um herói
– como em Batman The Dark Knight Rises. Além dos faniquitos de ansiedade que
simplesmente servem como um fraco lembrete de que o evento de Vingadores marcou
Tony – e muito mal, pois os piripaques não servem para nada no filme -, poderia
ser explorado algo que tem rico material em HQs: o alcoolismo. Vi algumas pessoas na internet dizendo que um bom recurso seria que ele mesmo provocasse a morte da Pepper sem querer, para aumentar o tom dark, mas achei isso um pouco exagerado...afinal, mesmo querendo um pouco de escuridão, é um filme do Homem de Ferro, né.
Esse era o filme para mostrar que o gênio deveria
baixar sua bola. Essa virada de personalidade seria até um ótimo trampolim para
o excelente Robert Downey Jr. mostrar mais do que suas piadas e sarcasmo o filme
todo.
As várias formas que o Mandarin já adquiriu nas HQs |
Outro recurso que foi até bem divertido de se ver mas que,
pensando mais sobriamente não consigo ver lógica, foi o garotinho que serve ao
papel do personagem improvável que levanta a moral e dá conselhos sábios ao
personagem principal. Um exemplo clássico disso é a mendiga que ensina diversas
boas lições ao menininho de Esqueceram de Mim 2. Em Iron Man 3, esse me pareceu
um recurso artificial, que infantilizou a obra – mas foi divertidinho de se
ver, confesso.
Pedaços voadores
Pelo trailer, me pareceu um interessante recurso as
armaduras que de algum modo seriam capazes de voar para o corpo dele, em pedaços. No
primeiro filme vemos toda uma engenhoca desengonçada – e bem maneira! –
responsável por montar e desmontar sua armadura. Isso tudo era feito enquanto ele
estava parado, mas na segunda película, o “mecânico” já tinha criado uma maleta
que virava uma armadura! Isso sem falar na estilosa máquina que desmonta a
armadura com o homem em movimento. No 3, temos uma armadura cujos pedaços voam
para seu corpo ao seu comando. No trailer, assim como nos primeiros minutos do
filme, me pareceu que era um mecanismo de ejeção, o que seria bem razoável de
se conceber. Mas depois de um tempo fica claro que não...cada peça da armadura
adquiriu seu próprio propulsor, capaz de voar metros, quilômetros! Nada mais
irreal, mesmo para um filme de heróis. Já temos que aceitar que uma bota pequena daquelas tenha um propulsor à jato capaz de fazer o cara voar em velocidades supersônicas, aí agora temos que engolir que pedaços de armadura tenham seus próprios propulsores? Aí foi demais. Iron Man e Iron Man 2 me acostumaram mal
ao tentar colocar uma aura de cientificidade em tudo que o gênio criava. Eu
ficava satisfeito pois não confundia ciência com magia, por mais que todo filme
do gênero tenha que ter umas mentirinhas. Nesse, a impressão foi que qualquer
coisa poderia ser feita graças à tecnologia assombrosa que o cara é capaz de
criar.
Talvez eu esteja sendo chato ao pegar no pé do filme, mas
quando passa aquele fogo do momento você inevitavelmente se pergunta sobre a
coerência da coisa e quando não a encontra, fica decepcionado. É como Thor, em
que eu esperava uma verdadeira epopeia mitológica e o filme só chegou perto
disso no trecho que se passa em Asgard. Todo o resto careceu de sentido,
sutileza e exploração profunda. Enfim, voltemos à Iron Man.
Apesar dos pesares, foi divertido
Apesar de tudo, achei o filme divertidíssimo, veria de
qualquer jeito no cinema. Apesar de ter trechos cansativos de tanta piada que fazem, ri várias vezes. Mas ficou faltando algo mais. Achei especialmente bom
o link que acho que os roteiristas quiseram fazer, nos remetendo ao primeiro
filme. Parece que as armas que Tony Stark criava serviram para criar o Homem de
Ferro em resposta aos terroristas e tragédias que sua tecnologia também criou.
E o Mandarin – o de Guy Pearce, o real – foi uma criação direta de sua típica
arrogância. E ao tentar confrontar o terrorista e tentar parar seus
atos, Tony se depara com sua própria criação. E no fim do filme, quando ele
tira o gerador de seu peito, que é o responsável pela energia que alimenta as
armaduras, é como se o ciclo se fechasse, pois no final os eventos que
colaboraram para que ele colocasse aquele treco o peito, geraram resultados que
mostraram que estava na hora de ele retirar e talvez deixar de ser o herói de
antes, nem que isso signifique que ele vá se reinventar para Avengers 2 – assim eu espero.