sexta-feira, 6 de julho de 2012

Deveria o Homem Aranha ser um herói?

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Em pleno ano de várias estréias de filmes de super-heróis nos cinemas – como O Espetacular Homem Aranha, que chega hoje as telonas – é bom lembrarmos que suas histórias são mais do que crônicas de ação e aventura. Inicialmente, Stan Lee foi quem introduziu este componente a mais: os questionamentos morais a cerca de o que é um super-herói e o que ele deveria fazer, e desde então essa maneira de fazer quadrinhos nunca mais foi abandonada. 
 Analisando a coisa por esse lado, analisemos o nosso herói aracnídeo. Peter é um adolescente quase chegando à vida adulta, um nerd incompreendido, odiado pelas garotas e humilhado pelos  malandros do colégio, além de ter perdido os pais muito novo. Num mundo real, o que aconteceria se ele adquirisse as habilidades sobre-humanas do Homem Aranha? Talvez, usaria isso em benefício próprio, vingando-se daqueles um dia fizeram pouco dele e, depois, usando-os em favor de si mesmo para ganhar popularidade ou até conseguir algum dinheiro. 


Esse tipo de visão faz parte da nossa intuição há milênios, tanto é que aparece em A República, livro escrito pelo filósofo Platão, que é uma compilação dos dizeres e diálogos de seu mestre, Sócrates. 

O anel de Giges
 No livro, Sócrates diz para seu fiel escudeiro Glauco [que só consegue ser mais side kick do que o Robin], que aquele que não possui riquezas materiais e prestígio, mas ainda assim segue o caminho da justiça, é mais feliz do que aquele que desfruta de toda materialidade e fama mas não segue o caminho da retidão moral. 

Será mesmo a Justiça um requisito para a felicidade? Glauco discordava. Para demonstrar como Sócrates estava errado, ele conta a história do Anel de Giges. Giges era um pastor à serviço do rei, e em uma de suas missões, encontrou um anel mágico que lhe conferia a habilidade de ficar invisível. Com o artefato em mãos – em dedos? – foi até o castelo do seu rei e o matou para logo em seguida roubar sua esposa. 

O que essa historinha nos revela? Como alegara Glauco, reflete a intuição, mostrando que o poder corrompe o homem, que qualquer um que tenha meios para passar por cima dos outros e obter benefícios para si, tornará isso realidade. Ou, nas palavras de Abraham Lincoln: 

"Se quiser por à prova o caráter de um homem, dê-lhe poder.”
O Bem, o Mal e a Justiça
Para refutar esse argumento, segundo Platão, Sócrates invoca a crença de que o Bem e o Mal são coisas que fazem parte da realidade, não são só produtos da mente humana. É como se algo nos dissesse o que é o que, como se intuitivamente fossemos guiados para o Bem. Por esse motivo, mesmo que o indivíduo sinta grande prazer em seus atos injustos, em algum momento ele vai perceber o vão caminho que percorreu.

Não posso deixar de notar que a história de Giges tem muita semelhança com a história contada séculos mais tarde por Tolkien em O Senhor dos Anéis. A diferença é que nessa história, os corajosos hobbits escolhem não usar o anel para fins escusos, escolhendo seguir - passando por tentações ao longo do percurso – a justiça. 

Aristóteles tinha uma opinião um pouco diferente. O filósofo negava a existência individualizada e independente do Bem, substituindo essa noção por um forte senso de teleologia, em que o Bem seria nada mais do que cada criatura chegar à excelência naquilo que elas podem fazer e ser. Assim, um cavalo deve ser forte e veloz, um leão, feroz, ágil e orgulhoso. O homem, portanto, deve atingir o ápice em suas potencialidades também, e como foi Aristóteles que primeiro (pelo menos no Ocidente) categorizou o homem como um animal que, diferente de todos os outros, era racional, nada mais do que justo que ele defendesse que devemos desenvolver ao máximo nossa razão. Nesta lista, também estavam nossas capacidades sociais e políticas. 

Se introduzirmos o Homem Aranha nesse contexto, podemos dizer que o “cabeça de teia” tem uma forte bússola moral, quevez ou outra pode abandonar mas sempre acaba voltando para os trilhos (Sócrates). Adicionalmente, dando um pouco de razão a Aristóteles, essa retidão à justiça foi conquistada com a evolução pessoal, aos poucos.   O que não seria compatível com a natureza humana, de fato, seria simplesmente não usar os poderes. E, de fato, é isso que percebemos em Homem Aranha 2, por exemplo, quando Parker resolve pensar em si mesmo em primeiro lugar e abdicar de suas habilidades que tanto atrapalham sua vida pessoal e profissional. Todavia, Peter parece não mais ser aquele anterior aos poderes aracnídeos, ele não pode dar um passo atrás na responsabilidade que adquiriu, recebendo seus dons. Da mesma forma, Peter teve problemas internos ao cometer atos reprováveis em benefício próprio, quando possuído pelo simbionte alienígena Venom. 

Desse modo, podemos inferir que, provavelmente Sócrates está certo ao dizer que aquele que servir à justiça será mais feliz do que aquele que não o fizer. Esse é o caso de Parker e de todos aqueles que em algum momento agem de forma heróica. 


Fonte:


Comentários (10)

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Interessante... Mas quanto ao Tolkien, é sempre bom lembrar que no fim das contas o desejo pelo poder acabou corrompendo o Frodo, e o anel só foi destruído porque o Gollum atacou o Hobbit. :)
1 resposta · ativo 664 semanas atrás
Algumas vivencias de Peter Park acabaram o levando para o caminho da justiça... Acredito que Peter já tinha uma bondade prévia, sempre foi muito inteligente e defendia pessoas menores mesmo não tendo condição. Acabou que esses poderes caíram nas mãos certas, provavelmente na maioria dos casos os poderias seriam usados para vingança (Muitos vilões são criados assim) mas ele sempre foi muito bem educado por seus tios e também puxou um pouco dessa bondade de seus pais que dedicavam suas vidas à estudos para ajudar outras pessoas.
1 resposta · ativo 663 semanas atrás
É...tem isso também, o Peter sempre pareceu ter bom coração. Mas além disso, ele também era um nerd azucrinado no colégio pelos fortões. E esse foi um dos motivos que fez ele usar os poderes inicialmente pra causas próprias: intimidar os caras no colégio, impressionar as garotas, se divertir escalando paredes e até ganhando dinheiro em lutas clandestinas. Talvez, sem o evento traumático da morte do tio Ben ele no mínimo demorasse bem mais pra cair na real e ver que era melhor ele usar as habilidades especiais dele para ajudar os outros e não egoistamente. Se levarmos esse fator do "bom coração" em conta, é como se a morte do tio Ben tivesse servido de catalisador pra essa tendência se manifestar.
Talvez, como a morte dos pais do batman o impulsionaram para uma vida heroica (Embora o Batman não tenha poderes). Em ambos os casos foi um desejo de vingança e justiça diante de uma desgraça.
Mas não é qualquer um que mesmo com essas circunstancias decide ser um agente da justiça, é preciso já ter uma tendencia a bondade antes de tudo.
"When an individual acquires great power, the use or misuse of that power is everything. Will it be used for the greater good? Or will it be used for personal or for destructive ends?" Charles Xavier.
1 resposta · ativo 662 semanas atrás
Claro, claro! Eu também acho isso!
Aliás, isso explica o motivo pelo qual muitos vilões passam pelos mesmos traumas e acabam se bandeando para o lado vilanesco da vida, né rs.

O Coringa, por exemplo, tem uma origem cheia de traumas, mas ele enlouqueceu e se convenceu de que o mundo é um caos e que ser bom ou ruim não importa, o que importa é seguir esse caos e tal.

O Magneto também é um caso clássico. Ele teve uma infância dura e desenvolveu um sentimento de vingança inabalável contra os humanos e também a crença numa guerra, em que ele devia, claro, ficar do lado dos mutantes. Ele, se compararmos com o Charles, tem uma visão muito pessimista, e não sei até que ponto realista. O Charles escolheu um ladoque não necessariamente está defendendo a realidade, mas está tentando mudar essa realidade, ou seja, promovendo a paz entre os dois lados, quando o mais provável é o surgimento da guerra mesmo. Na vida a gente faz escolhas desse tipo toda hora. O que vale mais a pena, lutar pela modificação de uma situação provável e torna-la positiva ou simplesmente seguir a maré e lutar pra sobreviver a todo custo?
Esse caso do Magneto e do Charles é bem classico, mas dessa vez devesse levar em conta que situação dos dois. Charles sempre teve uma vida bastante confortavel e agradavel enquanto Erick era testado em um campo de concentração depois de ter sua mãe morta... Enquanto Charles teve a chance de pesquisar sobre mutantes e suas possibilidades para com a sociedade e Erick via a repulsa e o medo que ele podia causar na raça "inferior".
O Homem aranha pelo menos foi educado e com amor, não teve confortos e sofreu, digamos, "bullying", mas ele tinha um amigo ou outro, não acredito que ele viraria um vilão. Vamos para um lado pessoal, na situação do homem-aranha, qual seria sua postura ?
1 resposta · ativo 662 semanas atrás
É verdade...esse caso do Charles e do Eric parece indicar que a infância éum fator muito relevante na hora de determinar nossas escolhas no futuro! Mas sei lá...como vc disse, eu também acredito no fato de que todos temos uma índole que de alguma forma interage com as influências ambientais, definindo o que somos. Poderia então, perguntar por que o Batman resolveu fazer o bem mesmo tendo uma infância trágica. Podemos dizer que os valores que os pais passaram a ele desde cedo determinaram isso. Mas talvez seja preciptado dizer que só a criação foi a causa disso. Com certeza, parte do caráter íntregos do Bruce Wayne deve-se aos mesmos fatores genéticos que fizeram os pais dele serem altamente íntegros.

No caso do Charles e do Eric acho que vale o mesmo.

Sobre a minha posição nisso...bom...Acho que posso pensar essa situação, para tratá-la mais realisticamente, nas artes marciais. Eu luto aikido e karate, certamente tenho alguma vantagem no combate corpo a corpo com alguém que não saiba nenhuma técnica. Mas a pergunta é: o que eu devo fazer com minhas habilidades? Sair por aí exibindoás - ou melhor ainda, procurando motivos e desculpas para sair por aí porrando todo mundo igual os famosos "jiujiteiros"? Acho que a máxima do tio Ben aí é universal: grandes poderes trazem consigo grandes responsabilidades...tanto para os físicos quanto para os abstratos.

Acho que eu tenderia a agir mais altruisticamente mesmo...claro que, protegendo ao máximo minha integridade física, já que lutar não me livra de levar uma bala rs.
hahaha acho que trocamos os papeis, voce que estava defendendo o fato dos traumas que podem levar a vilania e eu a educaçao que pode levar ao heroismo.
Como disse o proprio Christian Bale: ˜O Batman é o heroi que mais tende a ser vilão.". É bem complicado comparar o batman com o Magneto. Eric viveu em guerra e usou os poderes que ele ganhou para seguir o que ele acreditava, em alguns pontos ele até esta certo, apenas sua conduta e seus objetivos estao errados. Já o batman até que teve um infancia, com certo conforto, e ele usou desses recursos para se vingar da injustiça... É claro que isso não veio do nada, tem haver com a relaçao que ele teve com seus pais e tal...
Sinto dizer mas voce não é o batman hahaha Tipo, o batman tinha muitos recursos, alem da luta ele tinha armaduras e carros. Sim, ele que decidiu investir nisso, e nao sao todos as pessoas ricas que usam seu dinheiro para salvar o dia, mas como ele teve esses trauma de vivenciar a injustiça tao cedo + herança dos seus pais (nao me refiro ao dinheiro) fez ele se dedicar a isso. Trazer o batman pra realidade é bem complicado por ele ser muito possivel... Não vai ser tão cedo que vamos ver o Eike batista pulando de telhados por ai e salvando o dia. O Batman não é um cara rico qualquer, ele é o cara rico com um sentimento de justiça instalado já.
Mas por exemplo, se eu fosse picada por uma aranha radiativa eu provavelmente usaria para o bem se eu tivesse a habilidade necessaria. Eu não sei desenvolver um lançador de teias então estou em desvantagem... Mas tipo, se eu tivesse na rua e visse um assalto dava pra eu fazer algo com minha agilidade de aranha e pans... Mas uma coisa é voce ganhar os poderes do nada, a outra é vc ter os recursos para se tornar um super heroi e realmente investir nisso!
PS: Foi mal pelos erros de portugues, to num teclado estrangeiro e ta complicado pra achar assentos e acostumar com o posicionamento das teclas, mas da pra entender. acho que fui um pouco repetitiva mas ok .
1 resposta · ativo 662 semanas atrás
Mas a diferença fundamental entre o Batman e o Magneto, e também entre agneto e Xavier, é que o Magneto escolheu conduzir seu destino e lutar por aquilo que ele achava o mais provável de acontecer. Ou seja, um dia em que os humanos iam chegar ao ápice de atacar frontalmente os mutantes e a guerra estaria iniciada. Ele conduziu sua vida tendo em vista essa condição inevitável, só se preparando para ela. O Xavier, asim como o Batman, acreditavam no poder de mudar o destino, no sentido de que não exatamente se prepararam para ele, mas lutaram contra os acontecimentos mais prováveis, cada um a seu modo, claro.

haha Exatamente. E eu acho que é exatamente o fato de o Batman ser rico que impede ele, provavelmente, de existir de fato no mundo real. A grande maioria das pessoas que se mobiliza para algo é formada por aquelas que não tem recursos suficientes pra poder conviver pacificamente ignorando o que está a sua volta. É como a história do Buda. Sidharta Gautama era um príncipe envolto por riqueza, luxo e prazer3es, sem nunca ter tido uma real experiência com o sofrimento humano (velhice, doença e morte). Tudo que ele via era o prazer. Quando, um dia, acidentalmente ele vislumbrou essa realidade, nunca mais conseguiu ver sua riqueza material da mesma forma. O sofrimento era uma realidade para todos e ele precisava arrumar um jeito de acabar com o sofrimento.

Veja, sem a experiência real do sofrimento, ele nunca teria se mobilizado, abdicado de tudo e lutado em nome dele e de todos os outros. De certa forma, foi o que o Batman fez: apesar de ser rico pacas ele não desfruta verdadeiramente dessa riqueza...ele só usa o que é conveniente pra manter sua vida de vigilante mascarado.

No mundo real, ao contrário dessas histórias, vemos que dificilmente um ricaço se preocupa em realmente ajudar mais visceralmente aqueles que precisam. No máximo fazem doações e tal (o que já é grande coisa, claro). Por isso nunca veremos o Eike Batista aparecendo com uma fantasia ao ser chamado por uma versão do bat-sinal, o Eike-sinal. rs

Talvez um milionário agisse mais como o |Tony Stark antes de ser um Vingador, ou seja, o cara meio que só se intrometia em questões relacionadas à vida e à empresa dele...não eram grandes missões em nome dos fracos e oprimidos, mas de salvar seu próprio traseiro. hahaha Tanto é que o cara é o herói mais narcisista e fanfarrão dos quadrinhos

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